Nas últimas semanas uma série de
manifestações tomaram as cidades do país, reivindicando a
diminuição das passagens de trem, ônibus e metrô, impulsionadas
pelo MPL (Movimento Passe Livre), um coletivo autônomo e apartidário
que a quase 10 anos luta pelas questões relacionados ao transporte
público coletivo e tem como foco de reivindicação o passe livre,
ou seja, a gratuidade no uso destes meios de transporte para todos.
Muitos setores da esquerda aderiram a
luta do MPL e foram as ruas protestar e posicionar contra o aumento
das passagens em várias cidades do país, protestos estes marcados
pela ação direta e desobediência civil, que a mídia tradiconal
convenientemente chamou de baderna e vandalismo, com a clara intenção
de desmobilizar e desmoralizar o movimento, fazendo com que o cidadão
médio se indignasse contra as manifestações.
Mas o tiro saiu pela culatra quando o
Governador do Estado de São Paulo equivocadamente ordenou ao
aparelho de repressão do Estado, a Polícia Militar, que endurecesse
contra os manifestantes no ato da quinta-feira dia 13 de junho. A
violência da ação policial contra a classe média que estava nas
ruas gerou um clima de indignação na população e fez com que ao
invés do movimento diminuir, ele aumentasse espantosamente e na
segunda-feira dia 16 de junho cerca de 100 mil pessoas saíram as
ruas não motivadas pela pauta em questão, mas sim indignadas por
causa da ação da PM, e a partir daí introduzindo outras pautas que
não faziam parte do movimento.
Ao ver toda aquela gente na rua,
obviamente que todos aqueles envolvidos nas manifestações desde o
começo, se empolgaram, vendo a oportunidade de uma adesão real as
pautas políticas propostas pela esquerda que havia articulado tudo
aquilo, esquerda esta que inclui MOVIMENTOS SOCIAIS, PARTIDOS
POLÍTICOS, COLETIVOS, PESSOAS AUTÔNOMAS e claro, o próprio MPL
que era o disparador e articulador de tudo.
Mas a empolgação logo se transformou
em frustração, quando ao invés de termos pessoas engajadas na
pauta em questão, o transporte público, o slogan: “Não é só
pelos 20 centavos, é por direitos” e a ação policial da última
semana, fez com que pessoas dos mais variados tipos, orientação e
desorientação política se juntassem a manifestação querendo ser
ouvidas, mas agindo de forma contraria ao que estava acontecendo no
movimento desde o começo. Estes novos “manifestantes”
protestavam criminalizando a ação dos assim chamados vândalos,
mostrando que o discurso midiático havia funcionado, posando em
fotos ao lado da PM, dizendo que a luta era de todos, conclamando a
não violência e a paz nas ruas. Vestindo branco ou enrolados na
bandeira do Brasil, os novos caras pintadas entoavam o hino nacional
e canções que somente torcedores da seleção brasileira cantariam
(quem gosta de futebol de verdade sabe do que eu estou falando).
A princípio isto causou náusea
naqueles que estavam construindo o movimento desde as primeiras
semanas e esta náusea criou uma avaliação equivocada e um discurso
anti-coxinha nas manifestações, juntamente com um sentimento de que
“os verdadeiros” estavam perdendo espaço para aquilo que eles
sempre lutaram contra, dentro do movimento que eles mesmo criaram.
Várias mensagens foram postadas nas redes sociais, radicalizando
contra os coxinhas e a chamada “direita” que estava dominando as
manifestações, tentando fazer com que eles se adequassem ao modelo
e pauta proposta, ao invés de desvirtuar o movimento com um ufanismo
nacionalista e um discurso político moralista.
O erro ao meu ver foram dois, e admito
ter caído neste erro analítico também.
O primeiro foi esquecer que o cidadão
médio, aquele que não é envolvido com política, não tem cultura
política e só se preocupa com o tema em época de eleição, tende
sempre para as ideias mais a DIREITA, justamente por estas
apresentarem soluções mais imediatas e fáceis, carregadas de uma
carga moral, que não questiona em nenhum momento o establishment, ou
seja, não tira a ordem burguesa da sua ordem. Não questiona o
Estado por ser Estado, mas sim os políticos enquanto indivíduos, e
não coloca em cheque o modelo democrático vigente, mesmo não se
sentindo representado dentro dele. Os professores de história podem
afirma isto melhor do que eu, quando pensamos na instauração das
ditaduras no século passado, dos Fascismos, Nazismo, Comunismo
Soviético até chegarmos as ditaduras capitalistas na América
Latina, em todos os casos o povo as legitimou em um primeiro momento.
Desde então, uma sucessão de manifestações ocorreu e cada vez
mais os grupos se polarizaram neste sentido, a medida em que as
pessoas aderiam mais, a mídia começou a apoiar os atos (mas sem
vandalismo), e a polarização entre um lado radical de esquerda e a
turma da micareta foi ficando mais evidente.
O segundo erro foi realmente achar que
aquelas pessoas em clima de “O gigante acordou” eram realmente de
direita quando na maioria dos casos, eles nem sabiam exatamente o que
estavam fazendo, era só mais uma comemoração da Copa envolvida em
um discurso pseudo-político de quem nunca fez política na vida.
Eram pessoas normais que nem sabem a diferença entre direita e
esquerda, entre democracia e totalitarismo ou qualquer coisa do tipo.
Eram pessoas que precisam ser educadas e não rechaçadas! Mas não
entendemos desta forma e acirramos o discurso contra eles, os
coxinhas de direita.
Isto deu margem para que a direita
real, organizada e muito, mas muito bem disfarçada se infiltrasse no
movimento, capturando-o ideologicamente e sutilmente colocando suas
pautas que aparentemente são democráticas, mas cujos efeitos são
imprevisíveis. #ForaDilma #Contraacorrupção #Sempartido e por aí
vai. O cidadão médio não se pergunta: “E depois?” Mas nós
devemos nos perguntar e ajudá-los a entender.
Fora Dilma! Mas quem colocaremos no
lugar em uma democracia, já que não vamos derrubar o Estado?
Legalmente assume o Michel Temer, o que vocês acham? A direita
organizada já começa a falar de junta militar...medo!
Contra a corrupção! Muito bem, que
tipo de pauta política é essa? Em sã consciência quem é a favor
da corrupção? E o efeito disso é: como acabar com a corrupção? A
direita organizada já começa a falar em junta militar no governo
para higienizar a política....medo!
Perseguição aos partidos políticos e
movimentos sociais engajados na luta. Pois é, confundiram
apartidarismo com repulsa aos partidos, mas para o bem e para o mal
vivemos em uma democracia e democracia precisa de partidos políticos.
E tanto os partidos, quanto os movimentos sociais, estão nesta luta
desde o começo e por mais que eu discorde ideologicamente de muitos
deles, dentro de uma democracia, a existência deles é fundamental.
Unipartidarismo é ditadura, ou seja, mais uma vez a semente do
pensamento de direita é plantada sem que percebamos.
Hoje, dia 20 de junho de 2013, li
relatos na Internet de que haviam até neonazistas na avenida
paulista incitando o povo contra anarquistas, partidos e movimentos
de esquerda que lá estavam, e a massa com o seu comportamento de
massa, obviamente aderindo à ideia de que os partidos são o
verdadeiro câncer social que devemos eliminar.
E como a esquerda está agindo neste
contexto?
A esquerda, seja ela partidária ou
apartidária me parece perdida frente ao desafio de atuar ao lado das
pessoas comuns que são facilmente influenciadas dada a falta de
criticidade e de apuro político. Eu mesmo tive que conter alguns
garotos anarquistas na avenida paulista que estavam tentando queimar
a bandeira do Brasil de um casal que passeava tomando cerveja e
explicar para estes garotos que o momento agora, me parece muito mais
pedagógico do que bélico. Não devemos tentar lutar contra as
pessoas, pois elas realmente não sabem do perigo que correm sendo
manipuladas pos conservadores, nazistas e fascistas, devemos
chamá-las para conversa e explicar os nossos pontos, objetivos e
luta. Não devemos entender a bandeira do Brasil como um símbolo do
nacionalismo ufanista, mas sim tentar explicar que neste momento
precisamos abaixar as bandeiras nacionais, pois estas manifestações
nada tem a ver com o “orgulho de ser brasileiro”, é sim uma
crítica a forma como todos nós somos tratados neste país.
A esquerda precisa se organizar e se
unir, ao invés de se separar por motivos ideológicos. Criar uma
estratégia pedagógica para não deixar a direita dominar as
manifestações e desviar as pautas de reivindicação. É um momento
decisivo, antes deste movimento se esvair e todo o pensamento de
direita que pouco a pouco vem crescendo sem que as pessoas percebam,
acabe se tornado hegemônico e realmente perigoso para o país. É
hora de estar lá, não de abandonar o barco e deixá-lo naufragar
com um grito de ANAUÊ!