7/07/2009

O Epitáfio de McNamara


Em Sob a Névoa da Guerra, Errol Morris buscava a antítese de McNamara. Servindo na Segunda Guerra Mundial e tendo posição ativa no planejamento do bombardeio aéreo norte-americano ao Japão, McNamara logo escalou a pirâmide burocrática do Estado, chegando a servir como Secretário de Defesa dos Estados Unidos de 1961 a 1968 e atuando como presidente do Banco Mundial de 1968 a 1981. Teve, durante anos, acesso ao botão para o holocausto nuclear. Planejou centenas de ações do exército norte-americano e orquestrou boa parte da Guerra Fria. Foi a mente por trás do Vietnã. Era o protótipo do homem de Estado perfeito: astuto, sigiloso, organizado, brilhante. Nada parecia abalar o resultado de equações tão bem balizadas na razão. Assim, McNamara parecia indestrutível, irrefreável. Senhor do tal “compexo-militar-indústrial” citado por Dwight Eisenhower.
Mas Morris tinha uma pulga que não lhe deixava dormir. A névoa, o fog. Àquele, característico de Londres, que não nos permite distinguir as formas ou as cores e deixa tudo cinza. Com esta idéia, buscou o McNamara que nem o próprio conhecia, aquele que só podia ser entrevisto em uma ou duas trocas de olhares, ou num respirar fundo em entrevistas e coletivas.
Morris então montou uma câmera num tripé, colocou uma cadeira confortável e chamou McNamara para conversar. E então, o vacilante McNamara apareceu. Aquele que podia errar, que se arrependia, que titubeava. McNamara podia falar, livre das câmeras de TV, livre da imprensa, livre do compromisso com o Estado. Sem estar com as costas arqueadas pelo peso do mundo. Alí quase chorou. Pode se despir, ficar nu, tornar-se o que é. P É então que a mágica acontece: podemos ver um homem frente a suas escolhas. E tendo - porque não? - justificá-las.
O que fica não é o perdão, mas a certeza de que até aqueles que precisam ser infalíveis falham, e que a razão é a primeira a cair quando desce o véu racionalidade infinita. Todos morremos, e exatemente por isso não podemos esquecer. Que seja feita e refeita a história.
McNamara morreu, e Sob a Névoa da Guerra é seu epitáfio.


Nenhum comentário:

Postar um comentário