6/20/2013

E agora Esquerda?




Nas últimas semanas uma série de manifestações tomaram as cidades do país, reivindicando a diminuição das passagens de trem, ônibus e metrô, impulsionadas pelo MPL (Movimento Passe Livre), um coletivo autônomo e apartidário que a quase 10 anos luta pelas questões relacionados ao transporte público coletivo e tem como foco de reivindicação o passe livre, ou seja, a gratuidade no uso destes meios de transporte para todos.

Muitos setores da esquerda aderiram a luta do MPL e foram as ruas protestar e posicionar contra o aumento das passagens em várias cidades do país, protestos estes marcados pela ação direta e desobediência civil, que a mídia tradiconal convenientemente chamou de baderna e vandalismo, com a clara intenção de desmobilizar e desmoralizar o movimento, fazendo com que o cidadão médio se indignasse contra as manifestações.

Mas o tiro saiu pela culatra quando o Governador do Estado de São Paulo equivocadamente ordenou ao aparelho de repressão do Estado, a Polícia Militar, que endurecesse contra os manifestantes no ato da quinta-feira dia 13 de junho. A violência da ação policial contra a classe média que estava nas ruas gerou um clima de indignação na população e fez com que ao invés do movimento diminuir, ele aumentasse espantosamente e na segunda-feira dia 16 de junho cerca de 100 mil pessoas saíram as ruas não motivadas pela pauta em questão, mas sim indignadas por causa da ação da PM, e a partir daí introduzindo outras pautas que não faziam parte do movimento.

Ao ver toda aquela gente na rua, obviamente que todos aqueles envolvidos nas manifestações desde o começo, se empolgaram, vendo a oportunidade de uma adesão real as pautas políticas propostas pela esquerda que havia articulado tudo aquilo, esquerda esta que inclui MOVIMENTOS SOCIAIS, PARTIDOS POLÍTICOS, COLETIVOS, PESSOAS AUTÔNOMAS e claro, o próprio MPL que era o disparador e articulador de tudo.

Mas a empolgação logo se transformou em frustração, quando ao invés de termos pessoas engajadas na pauta em questão, o transporte público, o slogan: “Não é só pelos 20 centavos, é por direitos” e a ação policial da última semana, fez com que pessoas dos mais variados tipos, orientação e desorientação política se juntassem a manifestação querendo ser ouvidas, mas agindo de forma contraria ao que estava acontecendo no movimento desde o começo. Estes novos “manifestantes” protestavam criminalizando a ação dos assim chamados vândalos, mostrando que o discurso midiático havia funcionado, posando em fotos ao lado da PM, dizendo que a luta era de todos, conclamando a não violência e a paz nas ruas. Vestindo branco ou enrolados na bandeira do Brasil, os novos caras pintadas entoavam o hino nacional e canções que somente torcedores da seleção brasileira cantariam (quem gosta de futebol de verdade sabe do que eu estou falando).

A princípio isto causou náusea naqueles que estavam construindo o movimento desde as primeiras semanas e esta náusea criou uma avaliação equivocada e um discurso anti-coxinha nas manifestações, juntamente com um sentimento de que “os verdadeiros” estavam perdendo espaço para aquilo que eles sempre lutaram contra, dentro do movimento que eles mesmo criaram. Várias mensagens foram postadas nas redes sociais, radicalizando contra os coxinhas e a chamada “direita” que estava dominando as manifestações, tentando fazer com que eles se adequassem ao modelo e pauta proposta, ao invés de desvirtuar o movimento com um ufanismo nacionalista e um discurso político moralista.

O erro ao meu ver foram dois, e admito ter caído neste erro analítico também.
O primeiro foi esquecer que o cidadão médio, aquele que não é envolvido com política, não tem cultura política e só se preocupa com o tema em época de eleição, tende sempre para as ideias mais a DIREITA, justamente por estas apresentarem soluções mais imediatas e fáceis, carregadas de uma carga moral, que não questiona em nenhum momento o establishment, ou seja, não tira a ordem burguesa da sua ordem. Não questiona o Estado por ser Estado, mas sim os políticos enquanto indivíduos, e não coloca em cheque o modelo democrático vigente, mesmo não se sentindo representado dentro dele. Os professores de história podem afirma isto melhor do que eu, quando pensamos na instauração das ditaduras no século passado, dos Fascismos, Nazismo, Comunismo Soviético até chegarmos as ditaduras capitalistas na América Latina, em todos os casos o povo as legitimou em um primeiro momento. Desde então, uma sucessão de manifestações ocorreu e cada vez mais os grupos se polarizaram neste sentido, a medida em que as pessoas aderiam mais, a mídia começou a apoiar os atos (mas sem vandalismo), e a polarização entre um lado radical de esquerda e a turma da micareta foi ficando mais evidente.

O segundo erro foi realmente achar que aquelas pessoas em clima de “O gigante acordou” eram realmente de direita quando na maioria dos casos, eles nem sabiam exatamente o que estavam fazendo, era só mais uma comemoração da Copa envolvida em um discurso pseudo-político de quem nunca fez política na vida. Eram pessoas normais que nem sabem a diferença entre direita e esquerda, entre democracia e totalitarismo ou qualquer coisa do tipo. Eram pessoas que precisam ser educadas e não rechaçadas! Mas não entendemos desta forma e acirramos o discurso contra eles, os coxinhas de direita.

Isto deu margem para que a direita real, organizada e muito, mas muito bem disfarçada se infiltrasse no movimento, capturando-o ideologicamente e sutilmente colocando suas pautas que aparentemente são democráticas, mas cujos efeitos são imprevisíveis. #ForaDilma #Contraacorrupção #Sempartido e por aí vai. O cidadão médio não se pergunta: “E depois?” Mas nós devemos nos perguntar e ajudá-los a entender.

Fora Dilma! Mas quem colocaremos no lugar em uma democracia, já que não vamos derrubar o Estado? Legalmente assume o Michel Temer, o que vocês acham? A direita organizada já começa a falar de junta militar...medo!

Contra a corrupção! Muito bem, que tipo de pauta política é essa? Em sã consciência quem é a favor da corrupção? E o efeito disso é: como acabar com a corrupção? A direita organizada já começa a falar em junta militar no governo para higienizar a política....medo!

Perseguição aos partidos políticos e movimentos sociais engajados na luta. Pois é, confundiram apartidarismo com repulsa aos partidos, mas para o bem e para o mal vivemos em uma democracia e democracia precisa de partidos políticos. E tanto os partidos, quanto os movimentos sociais, estão nesta luta desde o começo e por mais que eu discorde ideologicamente de muitos deles, dentro de uma democracia, a existência deles é fundamental. Unipartidarismo é ditadura, ou seja, mais uma vez a semente do pensamento de direita é plantada sem que percebamos.

Hoje, dia 20 de junho de 2013, li relatos na Internet de que haviam até neonazistas na avenida paulista incitando o povo contra anarquistas, partidos e movimentos de esquerda que lá estavam, e a massa com o seu comportamento de massa, obviamente aderindo à ideia de que os partidos são o verdadeiro câncer social que devemos eliminar.

E como a esquerda está agindo neste contexto?

A esquerda, seja ela partidária ou apartidária me parece perdida frente ao desafio de atuar ao lado das pessoas comuns que são facilmente influenciadas dada a falta de criticidade e de apuro político. Eu mesmo tive que conter alguns garotos anarquistas na avenida paulista que estavam tentando queimar a bandeira do Brasil de um casal que passeava tomando cerveja e explicar para estes garotos que o momento agora, me parece muito mais pedagógico do que bélico. Não devemos tentar lutar contra as pessoas, pois elas realmente não sabem do perigo que correm sendo manipuladas pos conservadores, nazistas e fascistas, devemos chamá-las para conversa e explicar os nossos pontos, objetivos e luta. Não devemos entender a bandeira do Brasil como um símbolo do nacionalismo ufanista, mas sim tentar explicar que neste momento precisamos abaixar as bandeiras nacionais, pois estas manifestações nada tem a ver com o “orgulho de ser brasileiro”, é sim uma crítica a forma como todos nós somos tratados neste país.
A esquerda precisa se organizar e se unir, ao invés de se separar por motivos ideológicos. Criar uma estratégia pedagógica para não deixar a direita dominar as manifestações e desviar as pautas de reivindicação. É um momento decisivo, antes deste movimento se esvair e todo o pensamento de direita que pouco a pouco vem crescendo sem que as pessoas percebam, acabe se tornado hegemônico e realmente perigoso para o país. É hora de estar lá, não de abandonar o barco e deixá-lo naufragar com um grito de ANAUÊ!


3 comentários:

  1. Artigo perfeito. Parabéns!

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  2. Muito bom. Temos que nos organizar para alcaçar um objetivo de cada vez. Mais o os partidarios nao entendem é que um movimento que no começo sem força e politico. Virou um movimento forte e social. Por isso os manifestantes nao querem partidos envolvidos na manifestaçao. E garanto a vcs que as pessoas que lutam por colocar seus partidos no manifesto são a menoria. E o porque disso? Agora temos que revindicar nossos direitos como Brasileiros e nao pela direita ou esquerda.

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  3. O problema maior é que eles não querem aprender. Se de cem pessoas, uma só se informar fico feliz. Mas após essa causa do aumento da tarifa ganha, as pessoas perceberam que apenas indo para as ruas (mesmo sem não saber sobre nada) deu certo, essa maioria está convicta que só isso basta e pronto. Eu me senti desabrigada no meio da última manifestação que fui, e sim, da vontade de não voltar mais. É preciso uma união entre as pessoas mais centradas para que possamos voltar as ruas. Mas como? vi que agora existe uma disputa de liderança sobre os atos, e até os engajados estão pirando. Eu por enquanto vou me retirar. Lamentável.

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