2/06/2010

Uma História da Leitura - Alberto Manguel

Depois de anos trazendo a música no ouvido, observando paisagens reais, com pensamentos de trilhas sonoras imaginárias no transporte coletivo, me permiti (na verdade me obriguei) a aproveitar melhor esse tempo "perdido". A viagem matinal ao trabalho seria feita de outra forma agora. Tive de me programar em horários, estar atento em filas, acordando cedo, fazendo pequenos malabarismos, marcando a cara dos passageiros mais faladores, para me manter longe deles. Esse mês completei várias leituras atrasadas. Aos poucos vou soltando minhas impressões por aqui.

Os temas referentes a educação e a formação do indivíduo sempre me foram de interesse. Nesse campo a leitura é uma pedra fundamental para além da teoria pedagógica, e da práxis de aulas. "Ler" em minha opinião é muito mais do que o ato funcional de decifrar um repertório de códigos. Quem se debruça sobre um livro, com o devido treino de interpretação e estabelece uma relação de compreensão real ao campo de idéias ou fantasias, sai enriquecido. Assim a leitura mais que nos informa e ensina, também ilustra nossas fantasias, amplia nosso campo de sonhos. Sempre me incomodei com o descaso das escolas em tratar a literatura, com uma tarefa obrigatória pesada, monolítica, desprovida da capacidade de encantar os alunos, pois afinal, a ignorância é coleira presa na guia do controle.Na minha visão um tanto paranóica de mundo, existe um interesse bem classista em estabelecer mais e mais leitores "funcionais" do que desenvolver leitores reais, mas isso, que na real é papo bem chato fica para outra hora.

"Uma História da Leitura" (Companhia das Letras, 406 pags.) fala da relação leitor x livro de diversas formas, em diversos lugares e momentos. Alberto Manguel escreve agradavelmente, esparramando sua erudição, sem ficar pesado e chato, mistura experiência pessoal, pesquisa e paixão pelo ato de ler. A forma como discorre parte do pessoal, e creio eu, justifica o "UMA HISTÓRIA" por não existir uma história definitiva, existem visões, recortes de realidade, onde os indivivíduos, se relacionam na enorme teia do viver em sociedade.



Manguel pouco mais de 60 anos, é argentino de nascimento, canadense por opção. Tem uma grande lista de livros publicados. Em "Uma História da Leitura" dentre os diversos capítulos onde discorre sobre o ato de ler, fala também de si mesmo, assumidamente um apaixonado por livros. Em todos capítulos do livro, nomes como São Tomaz de Aquino, Kafka, Petrarca, Italo Calvino, Emily Brontë, Pablo Neruda, Fernando Pessoa, passeiam diante de nossos olhos, apresentados de uma forma próxima, com caracteristicas bem humanas e universais.


Alguns indivíduos sao privilegiados por condições familiares, outros por pura sorte. Manguel é um pouco dos dois. Para ilustrar um pouco do que falo, ele trabalhou quando adolescente em uma livraria. Além de se afundar em títulos mais variados e surrupiar outros de sua patroa, tirava o pó das estantes e atedia clientes. Um dia um velho cego adentrou a loja, pedindo um dicionário. O que um cego ia querer de um dicionário? O cego era Jorge Luis Borges, já famoso e reconhecido. Que lhe ofereceu uma oportunidade de aumentar mais suas finanças: Ler ao grande escritor, pois sua velha mãe ja nao tinha mais fôlego. Manguel foi durante um tempo os olhos de Borges, e ouvidos para seus comentários. Esse exemplo simples, de uma relação de amizade, que se ampara no ato de ler, ouvir e interpretar é uma de tantas passagens do livro. Mostra que os leitores, acabam "irmanando-se", congregando em seus silêncios individuais, a grande experiência que é dividir momentos, não só com o escrito, ou com quem escreve, mas fazendo da leitura algo maior, que aciona pessoas, em interesses comuns das mais variadas classes e vivências.

Dessa forma, em um momento onde as pessoas criam novos códigos de escrita, ou outras formas de leitura sao aprimoradas (vide kindle, ipad, etc) é importante ter um livro, que discorra sobre esse momento, íntimo e solitário, que pode ser público e devidamente acompanhado, mas que acima de tudo nos faz crescer como seres pensantes.

serviço:

http://www.alberto.manguel.com/

2 comentários:

  1. Ler é se encontrar com o mundo e no mundo. É instigante e extremamente motivador a identidade do leitor com o texto. A breve leitura da resenha de "Uma história da leitura" já desperta a vontade de estar com o livro.


    Cleuza Cunha

    ResponderExcluir
  2. O que diferencia um ser humano de um animal? Todos se comunicam, mas o homem escreve e transmite a seus pares signos que detém muito mais que meros significados. Escrever é o pontapé para o desencadeamento de uma "avalanche" de possibilidades, das quais a leitura é uma. Obrigado Manguel, por essa delícia compartilhada. Rogério Santana, estudante de Biblioteconomia

    ResponderExcluir