9/21/2009

Mais reflexões acerca do manifesto da 23 de maio.


Primeiramente gostaria de ressaltar que o blog da Revista Apes, assim como a própria revista digital é produzido por um coletivo de pessoas, com opiniões muitas vezes divergentes e que a partir das discussões e reflexões tentamos alcançar a espinha dorsal das questões abordadas, não para produzir consenso, pois afinal de contas sociedade é conflito, mas sim para produzir um dissenso crítico.


Eu não pretendia escrever a respeito das ações que ocorreram na 23 de maio no último dia 13 de setembro, mas tendo em vista a polêmica gerada em torno do post do meu amigo e co-produtor deste blog T. Cutovoi, eu resolvi postar uma breve reflexão acerca dos acontecimentos, para mostrar exatamente a pluralidade de idéias dentro deste coletivo símio.


Procuro pensar a arte sempre numa perspectiva político-social, até porque não tenho formação técnica em artes, pois minha formação é em sociologia, deste modo, a minha avaliação não tem tanta ênfase na discussão estética proposta pelo meu colega T. Cutovoi, apesar de concordar com ele neste ponto.


Primeiramente é preciso tentar compreender o que é hoje a tal street art e qual a sua relevância político-social, quais as forças que estão em jogo neste meio? A street art como conhecemos hoje, enfatizando principalmente o grafite e seu irmão maldito a pixação, tem o seu embrião nas manifestações políticas dos anos 60 (pixações) e a partir daí houve uma revolução através de Basquiat e outros artistas, para uma arte mais conceitual e técnica (grafite). Nos anos 80 este tipo de manifestação estava diretamente relacionada com as culturas que começavam a emergir nas periferias, principalmente dos EUA, e tinham uma relação direta com a contestação em relação à apropriação do espaço público, além é claro da auto-promoção dos grafiteiros e pixadores, até então marginalizados. Bom, podemos concluir que a street art, antes de qualquer coisa, é uma manifestação política, mas hoje encontramos esta manifestação totalmente deturpada na maioria das vezes. No mundo do capital, tudo se transforma em mercadoria e toda forma de contestação acaba mais cedo ou mais tarde sendo enlatada e vendida para nós em caixinhas coloridas com o rótulo de “última tendência” dentro das vanguardas culturais. A street art hoje é isso. É a última tendência. É o que há de mais descolado e pseudo-subversivo. Talvez a exceção seja a pixação, por ser algo feio e sujo, que realmente se contrapõe à lógica de mercado, pois não tem valor de troca. Mesmo inconscientemente, a pixação contínua sendo a pedra no sapato do tal cinza da cidade.



Esse ativismo todo que cerca o manifesto da 23 de maio, como a maioria dos ativismos contemporâneos são apenas fetiches da ação, pois pensar radicalmente aquilo que se faz se torna algo secundário. Dizer que as ações de street art visam levar a arte para quem não tem acesso a ela, só demonstra a lógica vanguardista e conseqüentemente hierárquica dos grupos envolvidos, ou seja, o discurso não passa por uma reflexão crítica e resvala sempre no senso comum de vanguarda (iluminar as massas). Nem ênfase técnica, nem disposição para fazer, fazem da arte algo realmente contestador. E na minha opinião, arte se trata disso: contestação. A inclusão, o chamado à participação em tudo a todo o momento, pode ser tão perigoso quanto o apelo da publicidade ao desejo. O manifesto da 23 de maio usa exatamente esta lógica de inclusão, onde todos (os grafiteiros) em nome de um só ideal se mobilizam de forma estéril para contestar o tal “cinza da cidade”. Vemos ai toda a reprodução dos modelos mais não-criativos de ação, vanguardismo e centralização. Os street artists, parecem não conseguir pensar fora deste modelo e é ai que se encontra o problema, pois se a arte de rua que sempre teve como principal característica a inovação, a descentralização baseada na liberdade de iniciativa dos artistas e principalmente a interação com os transeuntes numa perspectiva de contestação e reivindicação do espaço público, começa a reivindicar o colorido na cidade de forma coletiva e muitas vezes com coloridos bem ruins, é porque os artistas precisam voltar a refletir um pouco mais em suas ações. Ou seja, o problema não é o manifesto em si, mas sim a forma como ele foi idealizado, suas reivindicações, o conteúdo político por trás dele. A street art além de bela como reivindica meu amigo T.C., precisa tornar-se perigosa para voltar a ser atraente de verdade, e não apenas mais um hype gerador de lucros para uma meia dúzia de calhordas.


Imagem: Stencil do artista Banksy e Pixações na Bienal de São Paulo de 2009.

Um comentário:

  1. Salve!!!

    Ótimo blog!!!

    Tenhos aqui no Brasil um cartunista que na minha visão é bem melhor que o Banksy (não que ele não seja ótimo), mas o nosso CARLOS LATUFF é bem mais criativo!

    Vida longa ao blog!

    Provos Brasil
    www.provosbrasil.blogspot.com

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